4.01.2006

Homem Comum

Sou um homem comum
de carne e de memória
de osso e esquecimento.
e a vida sopra dentro de mim
pânica
feito a chama de um maçarico e pode subitamente
cessar.

Sou como você
feito de coisas lembradas e esquecidas
rostos e mãos,
o quarda-sol vermelho ao meio-dia
em Pastos-Bons
defuntas alegrias flores passarinhos
facho de tarde luminosa
nomes que já nem sei
bandejas bandeiras bananeiras
tudo misturado
essa lenha perfumada que se acende
e me faz caminhar

Sou um homem comum
brasileiro, maior, casado, reservista,
e não vejo na vida, amigo,
nenhum sentido, senão
lutarmos juntos por um mundo melhor.

Poeta fui de rápido destino.
Mas a poesia é rara e não comove nem move o pau-de-arara.
Quero, por isso, falar com você,
de homem para homem,
apoiar-me em você
oferecer-lhe o meu braço
que o tempo é pouco
e o latifúndio está aí, matando.

Que o tempo é pouco e aí estão o Chase Bank,
a IT & T, a Bond and Share,
a Wilson, a Hanna, a Anderson Clayton,
e sabe-se lá quantos outros
braços do polvo a nos sugar a vida e a bolsa.

Homem comum, igual a você,
cruzo a Avenida sob a pressão do imperialismo.
A sombra do latifúndio mancha a paisagem
turva as águas do mar
e a infância nos volta à boca, amarga,
suja de lama e de fome.

Mas somos muitos milhões de homens comuns
e podemos formar uma muralha
com nossos corpos de sonho e margaridas.

(Ferreira Gullar, 1963)

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Excpecionalmente comum
com eu e você...
como ontem, hoje e sempre

2 comentários:

Daniela Lima: disse...

Nossa, Clarinha, belo poema.

Viu a Carlotiiiinha? Linda!

Que horas você vem, uh?

Beijo!

Anônimo disse...

é... vou catar coisas dele pra ler....